domingo, 26 de abril de 2020

Uma Interpretação de Romanos 9 na Cosmovisão Soteriológica Arminiana (Part 2)


E não pensemos que a palavra de Deus haja falhado, porque nem todos os de Israel são, de fato, Israelitas (V:6)

A partir do Versículo de número 6 Paulo começa a desconstruir a ideia de alguns Judeus de que apenas pelo simples fato de possuírem descendência física de Abraão, estariam irrevogavelmente justificados ou salvos no mérito de tal descendência. Como escreve C. Hodge: “Era a opinião dentre os Judeus, de que, a promessa de Deus, sendo feita a Abraão e à sua descendência, todos os seus descendentes selados, pelo rito da Circuncisão, poderiam certamente entrar nas bênçãos do Reino messiânico[...]”[1]. E não apenas isso, Paulo também vai de encontro a ideia de que ser povo de Deus era uma prerrogativa exclusivamente herdada por direito de nascimento; contudo o que os Judeus precisavam compreender era que NEM TODOS OS DE ISRAEL SÃO DE FATO ISRAELITAS. Paulo se utilizando de tal expressão desejava demonstrar um sentido mais restrito do Termo Israelita/Israel.

A explicação dos sentidos do termo Israelita/Israel

No sentido mais amplo e consequentemente mais abrangente do termo Israelita/Israel, compreende todos aqueles que possuem uma descendência física de Abraão, Isaac e Jacó. No sentido mais restrito de tal termo, compreende todos aqueles que possuem uma descendência física de Abraão, Isaac e Jacó e que se tornam participantes das promessas da aliança por meio da fé em Jesus Cristo, e estes são, os de fato Israelitas, o verdadeiro Israel! Utilizando-se de uma ilustração de Leroy Forlines do qual faz uso do diagrama de Venn – Relação de Inclusão[2] – sendo o Conjunto (Israel A): Sentido mais Amplo e o Conjunto (Israel  B): Sentido mais restrito; Daniel Gouvêa afirma: "Assim todo o “Israel B” faz parte de “Israel A”, mas nem todo “Israel A” faz parte de “Israel B” Isto é [...]  (nem todos os de Israel são de fato Israelitas)"[3]. Com isso Paulo nega a consequência da Objeção levantada pelos Judeus[4] quando salienta: ‘E não pensemos que a palavra de Deus haja falhado’(V: 6), “acrescentando o motivo da negação, e a prova escriturística entrelaçada com a razão, por meio de alegorias ditadas por Deus, e explicadas pelo Apóstolo”. Armínio compreendeu muito bem todo o argumento Inicial de Paulo contra a objeção formulada pelos Judeus, comentando o seguinte:

“A razão consiste na distinção dos judeus e em sua dupla classificação em respeito a esta divina palavra e propósito, ou a partir da dupla descendência de Abraão, da qual somente uma foi compreendida naquela palavra e propósito. “Pois”, ele diz, “nem todos que são de Israel são Israel: nem por serem descendência de Abraão, eles são todos filhos”: mas há, entre eles, alguns “filhos da carne” e outros “filhos da promessa”; de onde conclui-se – se a palavra de Deus não abrange a todos os israelitas em uma característica, ela não falha, mesmo que alguns, dentre si, possam ser rejeitados; e muito menos, se eles são rejeitados de quem fica evidente, da palavra em si, então eles nunca foram compreendidos nela”[5]

Paulo utiliza-se de dois tipos[6] procurando provar o seu argumento, como afirma Armínio: "O apóstolo, então, prova que a palavra da promessa e da aliança compreende somente os filhos da promessa, à exclusão dos filhos da carne, e isto por um tipo duplo, um tomado da família de Abraão e o outro da família de Isaque. Contudo, duas coisas são pressupostas no argumento em ambos os casos, ambos apoiados pela autoridade do apóstolo, que deve ser considerada sagrada por nós. A primeira, que Ismael e Isaque, e Esaú e Jacó, devem ser considerados, não em si mesmos, mas como tipos naquelas passagens que ele apresenta. A outra, que eles são tipos dos filhos da carne e da promessa [7]". Ou seja, os filhos da Carne são prefigurados na pessoa de Ismael e os Filhos da Aliança são prefigurados na pessoa de Isaque. Ainda discorrendo sobre a importância da compreensão dos tipos na Figura de Isaque e Ismael, Armínio ressalta:

"Dessas coisas que estão sendo pressupostas, a força do argumento do apóstolo consiste na concordância entre os tipos e antítipos,[...] Mas deve-se observar que esta concordância consiste, não em sua semelhança exata, mas em sua mútua conexão e relação, sendo preservada a diferença adequada entre o tipo e o antítipo. Dou esta advertência para que ninguém possa pensar que seja necessário que aquele que representa os filhos da carne, deva ser ele mesmo um filho da carne, pelo modo da mesma definição[8]".

Analisaremos a seguir, de forma mais detalhada, a continuação do Argumento do Apóstolo Paulo.


Primeiro Tipo Utilizado Por Paulo 


E nem por serem descendentes de Abraão são todos seus filhos. Mas em Isaque será chamada a sua descendência. Isto é, estes filhos de Deus não são propriamente os da carne mas devem ser considerados como descendência os filhos da promessa, Porque a palavra da promessa é esta: por esse tempo virei e sara terá um filho (V:7-9)


Paulo ao afirmar: ‘E nem por serem descendentes de a Abraão são todos seus filhos’; enfatiza que nenhum dos descendentes físicos de Abraão são necessariamente herdeiros da promessa feita a este. Daniel Gouvêa salienta que o versículo 7 “introduzido pelo uso da conjunção coordenada negativa (Nem por serem descendentes[...]) é uma negativa ao pensamento de muitos dos Israelitas dos dias de Paulo. Enquanto estes pensavam que estavam irrevogavelmente justificados no mérito da descendência de Abraão (Jo 8:33-39), o apóstolo nega isso como no versículo 6, porém, agora, com mais especificidade”[9]. Essa especificidade é notada no uso do termo σπέρμα 'Αβραάμ (Gr: semente, filhos, descendência, prole) de Abraão. Todavia, Paulo, na mesma perícope, explicita quem são os verdadeiros Filhos de Abraão

Quem São os Verdadeiros Filhos da Promessa?

Quando atentamos para a história que envolve os nascimentos de Isaque e Ismael percebemos claramente a diferença dos acontecimentos que circundam os nascimentos dos mesmos. Se por um lado o nascimento de Isaque foi extremamente miraculoso e antecedido por uma promessa, por outro lado, percebemos a maneira apressada e extremamente leviana e consequentemente carnal – Envolvendo o esforço/obra humano – por de trás do nascimento de Ismael. Entretanto, em Gênesis 21:12 Deus deixou claro para Abraão que a sua ‘verdadeira’ descendência estaria em Isaque e não em Ismael; ‘Mas em Isaque será chamada a tua descendência’. A distinção entre os Filhos da Promessa-Filhos da Carne é realizada por Paulo, também de forma explícita, no versículo de número 8 e é ressaltada já no inicio de tal perícope através da  expressão "Isto é, estes filhos de Deus"; tal expressão, (filhos de Deus), "pode, sem dúvidas, indicar posse ou procedência, podendo ser entendido como "os filhos que são de Deus e procedem de Deus"[10]. Paulo ao usar o termo ‘os filhos da promessa’, evidencia o fato que o nascimento de Isaque é antecedido por uma promessa realizada por Deus e desta ele deriva, “promessa aqui representa a graciosa obra de Deus, feita para o homem, não porque o homem mereça ou tenha se esforçado (ou possa herda por descendência física) alguma coisa de Deus, mas porque Deus Simplesmente disse”[11]. Isto posto, “as promessas de Deus não têm falhado, por que elas são baseadas em seu próprio chamado, e não segundo o chamado, vontade e desejo humano”; Deus chama[12] os da verdadeira linhagem de Isaque e rejeita ou despede os da falsa (Ismael), Ou seja, de forma análoga, como afirma Bornschein: “A promessa sempre está relacionada a com a “fé”, e nunca com as obras”. Conclui-se logicamente que “Os filhos da promessa não são os simples descendentes de Abraão, mas aqueles que creem em Jesus Cristo”[13]; Portanto, a estes são direcionadas as bençãos prometidas a Abraão, pois os tais foram chamados pelo próprio Deus. O Apostolo com tal alegoria deixa bem claro que na história Deus já chamou alguns e rejeitou outros descendentes físicos e legítimos de Abraão, e no presente momento isso também estava ocorrendo, pois Paulo estava se dirigindo a um coletivo de Judeus que estavam individualmente rejeitando o seu evangelho, e certamente cada um era responsável por isso (Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação. pág, 73). Por outro lado, aquele coletivo de Judeus que estavam individualmente atendendo ao chamado divino, estes eram os verdadeiros Israelitas/Israel, estes eram os filhos da Promessa. Armínio Comentando sobre a distinção que Paulo realiza concernente aos Filhos da Carne e aos Filhos da Promessa Escreve:


"os filhos da carne são considerados pelo apóstolo, estranhos a aliança, e os filhos da promessa são considerados participantes da aliança. [...] Dos filhos da carne se diz, neste lugar, pelo apóstolo, serem aqueles que, pelas obras da lei, resultam depois a justiça e a salvação. Desta forma, também, o consequente é sustentado, sendo deduzido de sua doutrina concernente à justificação e salvação pela fé em Cristo. Pois não se segue, a partir disso, que alguns dos judeus são rejeitados, a não ser por esta marca distintiva, ou seja, que eles não creem em Cristo, mas seguem após a justiça da lei. Mas os filhos da promessa são aqueles que buscam a justiça e a salvação pela fé em Cristo"[14].

Através de tal alegoria, Paulo está procurando estabelecer a justificação pela Fé em Cristo, procurando ressaltar a ligação entre Fé e promessa em detrimento as obras/esforço humano no livro de Gênesis[15] e esse contraste é fortemente declarado e estabelecido por toda a epístola de Romanos, especialmente no capítulo 4[16]Daniel gouvêa ao comentar a primeira analogia de Paulo escreve:

"Então, em seu primeiro exemplo, Paulo demonstra que Deus era justo em rejeitar descendentes de Abraão, como no caso de Isaque e Ismael. Também observamos que existia um verdadeiro "Israel" dentro do Israel étnico, e o compromisso de Deus sempre foi com estes verdadeiros Israelitas, ou seja, os da Promessa ou da Fé (devemos lembrar que a fé está associada a tal promessa), e não com os da carne, descendentes de Ismael (que fora notoriamente fruto de uma obra humana precipitada e descrente da promessa feita por Javé no episódio da escrava Hagar)"[17].

Por meio de silogismo de refutação Armínio  sintetiza este primeiro argumento da seguinte maneira :

"Assim, este argumento, ao refutar a objeção judaica, pode ser construído. – Se a palavra de Deus compreende apenas os filhos da promessa, à exclusão dos filhos da carne, então segue-se que a palavra de Deus não falhou, mesmo se os filhos da carne são rejeitados: ela, na verdade, teria falhado se a tivessem recebido aqueles que são excluídos pela condição da aliança; – Mas a palavra de Deus compreende somente os filhos da promessa, à exclusão dos filhos da carne; – Portanto, a palavra de Deus não falhou, mesmo que os filhos da carne sejam rejeitados. Por consequência, também, – A palavra de Deus não falhou, mesmo que a maioria dos judeus seja rejeitada, desde que sejam abrangidos no número dos filhos da carne, e que eles são incluídos deste modo é evidente a partir da descrição dos filhos da carne. Esta descrição dos filhos da carne e da promessa é tão clara a partir das Escrituras, que não necessita de mais discussão. Mas os fundamentos das provas podem ser procurados a partir dos capítulos 4, 9 e 10 desta epístola e nos capítulos 3 e 4 da Epístola aos Gálatas"[18].












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Notas
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[1] Charles Hodge, Commentary on the Romans, P. 304
[3] Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação: Uma abordagem Bíblica, Exegética e Teológica de Romanos 9; pág, 69.
[4] O capítulo 9 de Romanos visa contra-argumentar uma objeção levantada pelos Judeus concernente a Justificação pela Fé em Cristo Jesus. Tal objeção é apresentada na (Part 1) Link: 
https://lucasamaciel.blogspot.com/2020/04/uma-interpretacao-de-romanos-9-dentro.html
[5] Vailatti, Carlos Augusto; Jacó Armínio-Uma Análise de Romanos 9; pag, 23-24
[6] A tipologia é um tipo especial de simbolismo. (Um símbolo é algo que representa outra coisa.) Podemos definir um tipo como um "símbolo profético" porque todos os tipos são representações de algo ainda futuro. Mais especificamente, um tipo nas Escrituras é uma pessoa ou coisa no Antigo Testamento que prenuncia uma pessoa ou coisa no Novo Testamento. A Tipologia Bíblica busca identificar, reconhecer e interpretar símbolos, tipos e alegorias das Escrituras Sagradas. https://www.gotquestions.org/Portugues/tipologia-biblica.html
[7] Ibid. pag, 27
[8] Ibid. pag, 28-29
[9] Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação: Uma abordagem Bíblica, Exegética e Teológica de Romanos 9; pag, 70-71
[10] Ibid. pag, 73.
[11] Robert Picirilli, Romanos. Pag, 177.
[12] Grant Osborne afirma que a expressão "em Isaque será chamada"(v 7) não reflete apenas o título pelo qual a prole de tal descendência seria chamada, antes, reflete o chamado do próprio Deus.
[13] Fred. R. Bornschein, A Oliveira Santa. Pag, 35.
[14] Vailatti, Carlos Augusto; Jacó Armínio-Uma Análise de Romanos 9; pag, 24, 25,26. 
[15] bem sabemos que devido ao fato de Abraão ter crido na promessa que Deus realizou a ele (Gênesis 15), isso lhe foi imputado para Justiça.
[16] Romanos 4:1-5, 12, 14, 16, 24; 8: 16,17,21
[17] Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação: Uma abordagem Bíblica, Exegética e Teológica de Romanos 9; pag, 76.
[18] Vailatti, Carlos Augusto; Jacó Armínio-Uma Análise de Romanos 9; pag, 25-26

terça-feira, 14 de abril de 2020

Uma Interpretação de Romanos 9 na Cosmovisão Soteriológica Arminiana (Part 1)



Preâmbulo do Capítulo de Romanos 9

Antes de apresentarmos uma interpretação Arminiana de Romanos 9[1], precisamos entender dois pontos que são crucias para que possamos interpretar tal Capítulo

Em primeiro lugar, como salienta Armínio: “O escopo principal do Capitulo é o mesmo de toda a Epístola: Que o evangelho, não a lei, é o poder de Deus para a salvação, não para aquele que pratica uma boa obra, mas para aquele que crê, uma vez que no evangelho a Justiça de Deus é manifesta na obtenção da salvação pela fé em cristo"[2].

Em segundo Lugar: Paulo ao longo do respectivo capítulo irá refutar uma objeção que determinados Judeus, contrários a sua doutrina, haviam realizado, demostrando que tal objeção possuía uma dupla falha; "o princípio inquestionável que os judeus utilizaram como suporte à sua objeção, não só não era prejudicial à sua causa, mas era até mesmo bastante favorável a ela"[3].

A Objeção dos Judeus

Armínio em sua carta destinada a Gellius Snecanus comentando sobre o capítulo 9 de romanos, discursa sobre essa objeção levantada pelos Judeus: “Se a maioria dos judeus é rejeitada, a palavra de Deus tem que falhar; – Mas não é possível que a palavra de Deus falhe; – Portanto, a maioria dos judeus não foi rejeitada” [4]. Comentando sobre o que fez levar alguns Judeus elaborar essa objeção, Armínio Escreve: “O Apostolo Paulo havia proposto uma doutrina que, necessariamente, incluía a rejeição dos judeus numa medida muito considerável, a saber, a justiça e a salvação devem ser obtidas pela fé em Cristo, não pelas obras da lei. Foi fácil para os judeus deduzirem disso: “Se a justiça e a salvação consistem na fé em Cristo, a quem Paulo prega, segue-se que os judeus, em sua maior parte, são rejeitados da aliança”[5].

Interpretação Arminiana de Romanos 9
Digo a verdade não minto, testemunhando comigo no Espirito Santo, a minha própria consciência: Tenho grande tristeza e incessante dor no coração, porque eu mesmo desejaria ser anátema, separado de cristo por amor de meus irmãos, meus compatriotas, segundo a carne (V: 1-3)
Os versículos iniciais de Romanos 9 são necessários para que possamos entender todo o respectivo capítulo, “dissociar o teor dos primeiros versículos de Romanos 9 do restante do capítulo pode trazer sérios prejuízos ao intérprete” (Daniel Gouvêa. Pag, 51)[6]. Paulo se utiliza de dois termos para expressar e deixar evidenciando ao leitor o seu sentimento que permearia todo o seu posterior discurso-argumentativo: grande tristeza (gr: tristeza, angústia como estado da mente) e incessante dor (gr: dor, sofrimento que implica em angústia e opressão do coração). A necessidade de Paulo em deixar nítido seus sentimentos, antecedendo o seu discurso-argumentativo, mostra que o mesmo desejava evitar que o seu leitor conjecturasse uma satisfação e alegria de Paulo na defesa do argumento "que Deus estava rejeitando o seu povo"; Paulo estava deixando bem claro a sua profunda tristeza nesse fato 'a rejeição de "Israel" por Deus'. Essa profunda tristeza também é expressa no versículo 3, como Calvino escreve: “Paulo, não hesitou o desejar para si mesmo a condenação que viu recair eminentemente sobre os judeus, a fim de libertá-los”. O desejo de Paulo de ser anátema era completamente verdadeiro, pois no versículo 1 ele inicia o seu discurso ressaltando que o testemunho da sua consciência diante da situação dos judeus era realmente profundo e consequentemente verdadeiro; contudo tal desejo – de ser anátema – era impossível de ser cumprido, e Paulo sabia muito bem dessa impossibilidade, tanto é que a construção gramatical realizada por Paulo apresenta essa consciência “[...] Desejaria ser, constitui [...] uma construção comum no grego e denota a expressão de um desejo real, porém impossível de cumprir”[7].
São Israelitas. Pertence-lhes a adoção e também a glória, as alianças, a legislação, o culto e as promessas; deles são os patriarcas, e também deles descende o cristo, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito para todo Sempre, amém! (V: 4-5)
O Apóstolo nos versículos 4-5 explica o porquê de sua profunda tristeza quanto a presente[8] rejeição de Israel. “certamente, a intensa e constante tristeza do apóstolo deve-se ao fato de que os judeus, que no presente estavam sendo rejeitados por Deus, foram no passado receptores de suas grandes bênçãos”[9]. Essas benção são elencadas por Paulo, conhecidas e afirmadas pelos Judeus, sendo elas:

São Israelitas: Paulo evidencia que em apenas ser Israelita, isso já constituía uma benção. Os filhos de Israel são o povo escolhido, aqueles que descendem dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó. Não apenas isto, o próprio  nome Israel já designava a especial relação de Deus com tal povo

Pertence-lhes a adoção: Por todas as Sagradas escrituras notamos o relacionamento paternal de Deus com a nação de Israel

A gloria: Refere-se as inumeráveis manifestações da presença de Deus entre o povo da Aliança

As Alianças: Paulo neste momento faz alusão àquelas que Deus fez com Noé, Abraão, Isaque, Jacó, Moisés e Davi “O uso do plural provavelmente se refere não à aliança feita com Moisés no Sinais ou com Abraão, mas todas as alianças feitas com os antepassados dos Israelitas no A.T"[10].

A legislação: A Lei foi entregue ao povo de Israel diretamente por Deus por intermédio de Moisés

O culto: Paulo enfatiza que os serviços nos templos e a liturgia de culto foram instruídos como uma benção para facilitar a adoração comunitária e o sistema sacrificial diante do povo de Israel

As promessas: As citações referentes as promessas realizadas por Deus ao longo da carta de romanos estão especialmente centradas naquelas feitas a Abraão, por isso, em virtude do contexto da carta e principalmente dos capítulos 9-11, faz sentido entender que as promessas aqui mencionadas sejam as promessas Abraâmicas

De quem são, ou a quem pertencem os patriarcas: A herança da nação veio através deles, e por meio deles, os hebreus se tornaram o povo especial de Deus

e também deles descende o cristo, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito para todo Sempre, amém!: As esperanças de nação de Israel sempre foram depositadas sobre a figura do Ungido ou Messias prometido. O uso Paulino de (Cristo) para Jesus visava afirmar seu significado como uma figura divinamente aprovada, que age como agente escatológico de Deus. A referência a cristo (Segundo a Carne) constitui uma ligação entre o Messias como sendo descendente dos patriarcas. A natureza do relacionamento entre Jesus e os Israelitas é defina, isto é, física. Não obstante isso não limita a messianidade de Jesus que é divina, e é sobre todos, Deus bendito para todo Sempre, amém!; conforme salienta Daniel Gouvêa:
“Essa expressão demonstra o senhorio Cósmico de Deus sobre a criação. Ele é o senhor sobre o universo e sobre a história, e sobre todos os seres bons e maus que habitam a criação. Paulo queria estabelecer de uma vez que aquele em que os judeus não estavam crendo era simplesmente o próprio Deus. Dessa forma, pode-se compreender o tom de profundo amor, solenidade e tristeza de Paulo, pois os Israelitas que naquele momento negavam a justificação pela fé em Jesus Cristo, estavam inevitavelmente sendo rejeitados pelo senhor[...] todavia, Paulo vai demonstrar que, diante de tal situação de incredulidade, Deus é perfeitamente Justo em Rejeitar os Judeus"[11].






Notas
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[1] Irei realizar uma série de Postagens discorrendo sobre Tema. Pretendi assim fazer para evitar que o texto se tornasse longo e cansativo para o leitor.
[2] Vailatti, Carlos Augusto; Jacó Armínio-Uma Análise de Romanos 9; pag,14.
[3] Ibid. pag,17-18.
[4] Ibid. pag,16.
[5] Ibid. pag,17.
[6] Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação: Uma abordagem Bíblica, Exegética e Teológica de Romanos 9; 128 pág.
[7] Ibid. pag, 54.
[8] C. Marvin Pate em seu comentário sobre o livro de romanos faz um paralelo entre o passado e o presente concernente a relação entre Deus–Israel e Deus–Gentios, afirmando que Paulo pretendia deixar bem claro que no passado Deus demonstrou sua misericórdia para com os filhos de Israel e ira para com os filhos dos gentios; no entanto, no presente, Deus estava demonstrando misericórdia para com os filhos dos gentios e ira para com os filhos de israel.
[9] Gouvêa, Daniel; A Soberania de Deus na Justificação: Uma abordagem Bíblica, Exegética e Teológica de Romanos 9; pag, 55.
[10] Ibid. pag, 58.
[11] Ibid. pag, 62-63.


quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Apocalipse; Literatura, Origem e Características



Conteúdo Literário

O Livro de Apocalipse encerra o cânon e a história do Novo Testamento. Apocalipse é o único livro do Novo Testamento dedicado inteiramente à profecia. A literatura apocalíptica era geralmente produzida em épocas de perseguição e opressão para encoraja aqueles que sofriam por causa de sua fé. Era caracterizada, minimamente:

Por intenso desespero com respeito as circunstâncias contemporâneas e por uma esperança igualmente intensa na intervenção divina no futuro

Pelo emprego de linguagem simbólica, de sonhos e visões

Pela introdução de potestades celestes e demoníacas, como mensageiros e agentes no progresso do propósito de Deus

Pela predição de um castigo catastrófico dos ímpios e de um livramento sobrenatural para os justos

O Livro de apocalipse ostenta tais características, não obstante, é um livro singular em comparação a outras obras que possuem um conteúdo semelhante, por exemplo, o autor revela o seu nome e parte do princípio de que é conhecido, não como uma celebridade do passado, mas como um participante contemporâneo dos assuntos relativos àqueles a quem se dirigia – tal exclusividade 'como muitas outras' o diferencia das literaturas com conteúdo apocalíptico antecedentes e precedentes, por exemplo: 2 Esdras ou o livro de Enoque)[1].

Destinatário, Datação e Autor

Tal livro fora destinado às setes igrejas da província da Ásia que já existiam havia bastante tempo e nas quais se verificara crescimento espiritual seguido de declínio. Quanto ao tempo na qual fora escrito o livro de apocalipse, a teoria mais aceita situa-o em finais do século I, no reinado de Domiciano (81-96 d.C.)[1]. Sendo o autor, como ele próprio diz, chamava-se João e fora testemunha ocular das coisas que vira (Ap 1.1, 2). Encontrava-se em Patmos, uma ilha rochosa ao largo da costa da Grécia, onde fora encarcerado por causa de sua fé. O Grego do Livro de Apocalipse é extremamente rudimentar, alguns Estudiosos do N.T afirmam que devido a essa característica, este é o único livro que fora escrito por João sem Auxílio algum de um "Escriba". Esse fato por si só causa inúmeros problemas para os interpretes do Livro de Apocalipse. Um outro fator que também poderíamos elencar que gera dificuldades para os interpretes é as alusões constantes ao A.T, cerca de 400 são realizadas por João.

A Interpretação de Apocalipse

Dentre as várias escolas de Interpretação que labutam em compreender o Livro de Apocalipse, destaco a Futurista, pois tal escola afirma que os primeiros três capítulos de Apocalipse se aplicam ao tempo em que o livro foi escrito – alguns adeptos da escola futurista entendem que existe também uma segunda referência nestes 3 capítulos inicias “Sete épocas na história da Igreja, lançando uma ponte sobre o hiato existente entre a era apostólica e o regresso de Cristo” – e a partir do capítulo 4,  o resto do livro discutirá acontecimentos que terão lugar em período chamado  de  ‘A grande Tribulação’ - salvo algumas exceções. Os acontecimentos de Apocalipse relegados para esse período são interpretados tão literalmente quanto possível, sendo, portanto, considerados como inteiramente futuros no que diz respeito à era presente. Além da discussão que envolve o momento que se dará o arrebatamento da Igreja, "se antes, durante ou após a grande tribulação"[2], Um outro ponto que fazem as escolas de interpretação divergirem é o capítulo 20 do livro de Apocalipse, "os mil anos devem ser considerados como literais ou simbólicos, e se precedem ou se seguem à vinda de Cristo"; Destaco assim, a interpretação da Escola Futurista, pois é afirmado a literalidade dos Mil anos, que dar-se-á após o Retorno pessoal de Cristo.

Apocalipse em Esboço

O livro de Apocalipse Possui o seguinte Esboço:



Prólogo: A Comunicação de Cristo (1.1-8)

Visão I: Cristo na Igreja: O Senhor Vivo (1.9–3.22)

Visão II: Cristo no Cosmos: O Redentor (4.1–5.14)

Visão III: Cristo em Conquista: O Guerreiro (17.1–18.24)

Visão IV: Cristo na Consumação: O Cordeiro (21.9-21)

Epílogo: O Chamado de Cristo (22.6-21)



Notas
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[1] Após a morte de Tito – um dos imperadores mais populares que houve em Roma –, Domiciano, seu irmão mais novo, foi levantado imperador de Roma, título concedido pelo senador pelo fato de Tito ter morrido sem deixar filhos. Domiciano reconstruiu os templos dos velhos deuses e suprimiu as religiões estrangeiras, especialmente as que procuravam conquistar adeptos. Exigiu que lhe prestassem adoração e insistiu em ser aclamado como Dominus Et Deus “Senhor e Deus”. Segundo a tradição executou o seu sobrinho, Flávio Clemente, por se recusar a oferecer sacrifícios diante de sua imagem, como também vários Cristãos e Judeus que recusaram-se a adorá-lo.

[2] No Link a seguir, com base em II Tessalonicenses 2:3, argumento que a igreja não passará pela Grande Tribulação, fazendo uma analise exegética da palavra traduzida por "apostasia" em tal perícope
https://lucasamaciel.blogspot.com/2017/12/teologia-do-novo-testamento-ii.html 




Dedicatória

Dedico a Brenda Cristine (Espero muitíssimo que lhe seja útil este "artigo")

sábado, 12 de outubro de 2019

Apologética Teísta: Argumento Cosmológico de Leibniz Para a Existência de Deus (Part 2)




Dois enunciados são logicamente equivalentes se for impossível que um deles seja verdadeiro e outro falso, ou sejam: Se P, então Q. Segundo Leibniz: "Se o Universo tem uma explicação para existir, então o ateísmo não é verdadeiro", isso equivale a dizer que "Se o ateísmo é verdadeiro, o universo não tem uma explicação para existir". Portanto, analisemos a segunda premissa do argumento de Leibniz para a existência de Deus[1].

Se o universo tem uma explicação para existir essa explicação é Deus

Essa premissa de Leibniz, para um leigo, pode ser interpretada como uma afirmação que não possui quaisquer reflexão intelectual - até mesmo em muitos círculos, onde estão infestados de "acadêmicos", a declaração dessa premissa poderá ser respondida com Sarcasmos e Ironias - entretanto, Leibniz chega a essa conclusão devido justamente a um reflexão intelectual seria e honesta no que diz respeito a relação que há entre a existência de Deus e a existência do universo. 

A Causa do Universo: Um Objeto Abstrato ou Uma Mente Sem Corpo Físico?

Segundo Leibniz, toda a realidade que compõe o Universo, como por exemplo: Tempo-Espaço, toda a matéria e energia, demanda uma causa que seja não-Física, Imaterial, e que esteja além do tempo e do Espaço. Existe somente duas coisas que se encaixam nessa descrição: um Objeto abstrato[2], como um número, ou uma mente sem corpo físico. Contudo, objetos abstratos não podem ser causa de absolutamente nada - Isso está intrínseco ao próprio ser dos objetos abstratos, ou seja, isso faz parte do que significa ser abstrato. Logo, a causa da existência do universo, conforme Leibniz conclui, deve ser uma mente transcendente, e é isso que os cristãos entendem por Deus. Conforme salienta Willian L. Craig:

"Se bem-sucedido, este argumento prova a existência de um Criador pessoal do universo, um Criador necessário, não causado, acima do tempo e do espaço e imaterial. Não estou me referindo a alguma entidade mal concebida, como um ser extraterrestre, mas um ser ultramundano[3] e que possui as muitas propriedades tradicionais de Deus. Isso é verdadeiramente fascinante!"

 A Causa do Universo: "O Universo Existe necessariamente"

Por mais Incrível que possa parecer, essa afirmação poderá ser feita por alguns Ateus ou Agnósticos, não obstante, tal alternativa é uma "ilusória" resposta para o Argumento Cosmológico de Leibniz[4]. Não apenas isso, o fato pela qual ateístas de grande rigor acadêmico não parecem ansiosos para abraçar essa alternativa é devido ao fato de que nenhuma das coisas que compõe o universo parece existir necessariamente. Todas essas coisas poderiam deixar de existir - em algum momento do passado nenhuma delas existia - e levando em consideração  o modelo padrão da física subatômica e as suas implicações, a contingência do Universo - refiro-me ao que conhecemos e entendemos do Universo -  implica na mesma afirmação: o Universo não existe necessariamente. Willian L. Craig afirma:

"Minha tese de que o universo não existe necessariamente fica ainda mais óbvia quando pensamos que parece ser inteiramente possível que os elementos fundamentais que constituem a natureza poderiam ter sido substâncias inteiramente diferentes as partículas subatômicas que hoje temos. Tal universo se caracterizaria por leis da natureza diferentes. Ainda que tomemos nossas leis da natureza como algo logicamente necessário, ainda assim é possível que existissem diferentes leis por causa das substancias dotadas de propriedades e capacidades diferentes das nossas partículas subatômicas poderiam ter existido. Nesse caso estaríamos claramente lidando com outro tipo inteiramente diferente de universo. Portanto, os defensores do ateísmo não foram tão ousados a ponto de negar a segunda premissa e dizer que o universo existe necessariamente."

Conclusão 

Não há outra alternativa, a não ser, juntamente com Leibniz, afirmarmos: "Deus é a explicação da Existência do Universo." Não obstante, o argumento salienta de forma explícita verdades Teológicas contidas nas Sagradas Escrituras concernente ao Ser de Deus:

1: Deus não é causado: Gênesis 1.1 
2: Uma mente não encarnada em um corpo: João 4.24
3: Transcende o Universo Físico: Colossenses 1.17
4: Transcende o Tempo: 2 Pedro 3.8
5: Transcende o Espaço: 2 Crônicas 6.18
6: Existe necessariamente: Êxodo 3.14


"Porque dele e por ele, e para ele, são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém." (Rm 11.36)





Notas
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[1] Recomento a leitura da publicação anterior sobre o argumento cosmológico de Leibniz para um melhor entendimento e compreensão da leitura que será feita a seguir: 
[2] Na filosofia objetos abstratos são aquele que são causalmente estéreis ou impotentes, enquanto que objeto concretos são capazes de causar efeitos no mundo.
[3] A palavra "Ultramundano" empregada por Craig denota algo que é além do domínio do Universo.
[4] Tomas de Aquino chegou a desenvolver uma apologética para a Existência de Deus levando em consideração a existência necessária do Universo.



Dedicatória:

Dedico essa publicação a Tiago Cipriano: "Nossas conversas Teológicas são compostas por grandes batalhas, possuindo como fim último, o aprendizado - Irônico, não?".