sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Mitos Sobre o Dispensacionalismo (Part 2)




A Salvação sem Senhorio é algo intrínseco ao Sistema Dispensacionalista

A Teologia do não senhorio pode assumir diferentes formas, mas geralmente é caracterizada pela tese de que o arrependimento e a submissão da vida da pessoa a Cristo, não são necessárias para que haja a salvação. Na obra "A Layman's Guide To The Lordship Controversy", Belcher enumera 6 principais características da teologia do não senhorio, sendo elas:

  1. O Chamado para a salvação e o chamado para o discipulado são distintos;
  2. O crente pode escolher entre produzir ou não produzir frutos espirituais em sua vida;
  3. A falta de frutos espirituais não é sinal de que a pessoa está perdida;
  4. O arrependimento não é uma condição para a salvação;
  5. O conceito de senhorio não é uma condição para salvação mas deveria seguir a experiência de salvação pela fé;
  6. Aqueles que possuem uma verdadeira fé Salvadora podem viver habitualmente em pecado ou mesmo apostatar da Fé.
Gerstner, afirma que o Dispensacionalismo é a causa direta do surgimento da Teologia do não senhorio, não apenas isso, ele também assevera que o Dispensacionalismo declara e aceita que: "[...] uma pessoa pode ter Cristo como Salvador, mas recusa aceitá-lo como Senhor em sua vida". Não obstante, a teologia do não senhorio além de forma alguma ser algo inerente ao dispensacionalismo, a mesma não é resultante dela. Vlach se utiliza de dois argumentos para provar tais fatos ao explicar, em primeiro lugar, que o dispensacionalismo por se tratar primeiramente sobre eclesiologia e escatologia não permite necessariamente quaisquer tipo de conexão entre o tema do senhorio, pois o mesmo faz parte e é um assunto soteriológico. Realmente alguns dispensacionalistas defendem ou possuem claras tendências ao nao senhorio, contudo Vlach ressalta que dispensacionalistas, como por exemplo Saucy, questionam quaisquer tipo de ligação histórica entre a teologia do nao senhorio e o dispensacionalismo ao escrever: "A posição radical do não senhorio de alguns dispensacionalistas contemporâneos, negando a necessidade na salvação de uma 'fé que opera' baseada em Tiago 2. 14-26, nunca fez parte do dispensacionalismo tradicional ou clássico" (The Case for Progressive Dispensationalism). Em segundo lugar, vários Teólogos dispensacionalistas de liderança - incluindo o próprio Vlach - rejeitam explicitamente a visão de não senhorio. Juntamente com Saucy e MacArthur, Vlach tece críticas as obras de Zanes Hodges "The Gospel Under Siege" e Absolutely Free", as quais são, "promoções explícitas da teologia do não senhorio". Estranhamente Gerstner chega a citar Jhon MacArthur contra dispensacionalistas que aderem a teologia do nao senhorio, "No entanto a lógica nesse caso é estranha. Gerstner  menciona o dispensacionalista Jhon MacArthur para mostrar que a visão do não senhorio alegada pelo dispensacionalismo é errada. Porém, em vez de provar o ponto de Gerstner , seu uso de Jhon MacArthur mostra que há diversidade dentro do dispensacionalismo nessa questão e que não há conexão inerente entre o despensacionalismo e a teologia do não senhorio" (Michal J. Vlach). Portanto, uma coisa é você discutir o que tem levado alguns dispensacionalistas aderir tal visão, outra coisa é afirmar e defender que tal teologia é resultado do dispensacionalismo ou é algo inerente a ele.

O Dispensacionalismo está essencialmente ligado ao Antinomismo 

Uma das principais acusações lançadas por vários críticos, como por exemplo: Gerstner, Curtis Crenshaw e Grover Gunn, é a de que o dispensacionalismo está inerentemente ligado ao antinomismo [1]. R.C Sproul, prefaciando a obra de Gerstner "Wrongly Divinding The Word of Truth", escreveu: "Uma das acusações mais sérias que Gerstner faz ao dispensacionalismo é a de que o seu sistema é inerentemente antinomista". O termo antinomismo vem da junção de duas palavras gregas αντί (Contra) e νόμος (Lei). Robert D. Linder conceitua o Antinomismo da seguinte maneira: "A doutrina de que para o cristão não é necessário pregar e/ou obedecer a lei moral do AT". O Antinomismo Teologico é "frequentemente associado ao endosso de um comportamento sem lei" (Robert A. Pyne). Michael Vlach, fazendo referência a obra de Gerstner, apresenta o cerne do argumento a favor da premissa de que o dispensacionalismo é antinomista: "Gerstner acredita que o dispensacionalismo é antinomista por causa de sua afirmação de que o cristão não está sob a lei mosaica, e por sua alegada falta de "compressão das doutrinas de justificação e de santificação da Reforma"". Ou seja, No entendimento de Gerstner o dispensacionalismo como sistema ressalta que "as pessoas podem ser justificadas sem se tornarem santificadas. E isso claramente induz o crente a serem "carnais"". Devido a isso, ele escreve: "todos os dispensacionalistas tradicionais ensinam que pessoas cristãs convertidas podem de fato (não apenas tem permissão) viver em pecado durante sua vida após conversão, sem qualquer risco para o destino eterno delas"; portanto o dispensacionalismo está "comprometido com a doutrina inegociável do antinomismo". Entretanto, Vlach esclarece que "ao contrário do que Gerstner afirma, muitos dispensacionalistas consideram uma conexão inseparável entre justificação e santificação. E muitos não aceitam que uma pessoa possa ser justificada sem também ser santificada. Não só não existe nada dentro do dispensacionalismo que faça com que um dispensacionalista separe justificação de santificação, mas muitos dispensacionalistas vem à justificação e a Santificação como inseparáveis" (Dispensacionalismo, Crenças essenciais e mitos comuns; pag, 88). MacArthur, Donald G. Barnhouse e Alva J. McClain são muitos autores dispensacionalistas proeminentes que fazem coro com Michael J. Vlach nesse entendimento. Em segundo lugar, é correto afirmar que os cristãos hoje não estão sob a lei mosaica, todavia eles não estão sem lei! Os não dispensacionalistas caem em tal erro ao sustentar que os dispensacionalistas rejeitam a "lei moral". Curtis Crensshaw e Grover Gunn na obra "Dispensacionalismo Today, Yersterday, and Tomorrow" escreve: "há um antinomismo inerente ao dispensacionalismo [...] Rejeitar a lei moral, especialmente a lei moral do AT, resulta em um número de consequências. Eles tendem a rejeitar a ideia de que Cristo agora governa pela sua lei (ou, Aliás, qualquer lei) como rei dos reis, alegando isso para um futuro Milênio. Isso, por sua vez, os leva a rejeitar o seu senhorio sobre a salvação e sustentar que se pode ter fé sem obras (a ideia do Cristão carnal). Ou seja, como muito bem resume Vlach "Para eles, os dispensacionalistas rejeitam a lei moral de Deus e consideram que os cristão estão livres para agirem carnalmente". Sobre isso Feiberg comenta: "Alguns argumentam que o dispensacionalismo impõe o antinomismo, visto que os dispensacionalistas alegam que a lei foi abolida, porque Cristo é o fim da lei (Rm 10:4). Embora alguns possam sustentar esse ponto de vista, dificilmente ele é a norma ou os dispensacionalistas precisem dele". (Feinberg, Sistemas de descontinuidade). Logo, como frisa MacArthur, dizer que o Antinomismo está no cerne da doutrina dispensacionalista é um tremendo mal-entendo e consequentemente um erro. É importante salientar o que Vlach tece: "Não estamos negando que certos dispensacionalistas tenham tendências antinomistas (mesmo que não saibamos de algum dispensacionalistas que esteja defendendo uma vida sem lei). Negamos porém, que o próprio dispensacionalismo seja inerentemente antinomista. Um sistema primariamente voltado para a eclesiologia escatologia não pode necessariamente conduzir ao antinomismo". Assim sendo, Vlach conclui: "A afirmação de Curtis Crensshaw e Grover Gunn de que o dispensacionalistas rejeitam a "lei moral" é uma deturpação daquilo que os dispensacionalistas creem". A questão é que estamos sobre uma nova Lei - A Lei de Cristo, através da qual são comunicadas as lei morais de Deus. Strickland e Blaising elucida que a lei de Cristo é normativa nos dias de hoje para o cristão, assim como a lei mosaica era para o judeu. A lei mosaica foi substituída pela lei da nova aliança, ou seja, a lei de Cristo é a contraparte da nova aliança para a lei mosaica. Portanto, O dispensacionalismo de hipótese alguma possui o antinomismo como algo inerente/sine qua non/ ao seu sistema. Acertadamente Millard Erickson discorrendo sobre o dispensacionalismo reforça que a: "lei moral está em pleno vigor[...] embora seu conteúdo exato possa variar". Logo, Feiberg observa que: "Os dispensacionalistas afirmam que o crente está sob a lei de Cristo como descrita no N.T. Como no caso do código mosaico, a lei de Cristo personifica os princípios Morais de Deus eternamente verdadeiros, os quais são exemplificados Em ambos os códigos. Mas, como um código separado, a lei de Cristo exclui os aspectos cerimoniais e civis do código mosaico. O dispensacionalismo não é nem antinomista nem obriga"(Sistemas de descontinuidade). destarte, três pontos precisam ser elencados: 

Em primeiro lugar, a lei moral do A.T tem o seu paralelo na lei de Cristo; 
em segundo lugar, levando em consideração o primeiro ponto, o crente pode conhecer e deve - a lei de cristo é obrigatória para o cristão - viver a vontade moral de Deus. 
em terceiro lugar, mas não menos importante, conforme realçado por Blaising, um dos maiores especialistas na história do dispensacionalismo, a conexão entre o dispensacionalismo e o antinomismo é extremamente exagerada. " Não estou convencido por Gerstner que o antinomismo foi tradicionalmente compreendido como representante do dispensacionalismo".(Dispensationalism: The Search For Definition).





NOTA
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[1] Há alguns que acreditam que existe algum tipo de "Antinomismo Dispensacionalista". Esse termo encontrei recentemente em uma publicação no Facebook.

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